XIBIMBA: CENA DE UM ADEUS,
Autor: João Maria Ludugero
Deu meio-dia, badalou dobrado o sino da igreja.
Aí então, me veio à memória a imagem de um cortejo funeral
a caminho do cemitério municipal, subindo a rua nova,
ali na subida da casa de Seu Vela, pai do Walfredo,
depois de ter saído da Matriz de São Pedro,
acompanhado por uma dúzia de fiéis varzeanos.
Ouviam-se os bronzes insistentes da matriz,
no choro solitário de dona Lucila de Preta e sua extensa prole,
cadenciados com os flapes-flapes das alpargatas,
que solavam o chão quente e poeirento
daquela artéria central da Várzea
de dona Dalila Maria da Conceição,
minha avó paterna.
Rezas e choros pela rua do Cruzeiro,
quase já não se ouviam!
Cantigas, Ave-Marias, vozes e consolos?
Talvez a do padre Armando de Paiva
ou de um transeunte encostado na calçada
da Venda de dona Bena de Virgílio,
que, curioso, perguntasse de quem havia sido a ideia
de encaminhar um cortejo funeral em pleno meio-dia.
Isso mesmo, era essa a hora marcada pelo relógio da igreja.
De fato, os ponteiros se emparelhavam um sobre o outro,
indicando meio-dia e dali nunca mais ousaram sair,
cravados assim na minha memória,
mesmo tendo se passado tantos anos, ainda guardo essa cena
daquele passamento ocorrido da década de setenta.
É isso mesmo, é consabido que de despedida ninguém gosta,
não é mesmo dona Vira de Lucila de Preta?
Faz-se questão de esquecer, passar a borracha.
Morrer, no sentido biológico é extinguir-se,
desaparecer para sempre.
Se alguma coisa fez, se de bom ou de mau,
para a memória popular isto é irrelevante,
o sujeito ainda será lembrado por um bom tempo.
Se não, cai na poeira do tempo, e assim descamba,
é levado pelo vento e cai no campo do esquecimento.
Mas a vida tem dessas coisas.
Essas cores de dias cinzas também um dia chegam
e estampam a vida da gente.
Não há como escapar da sina, portanto,
deve-se tocar a vida, seguir adiante,
sem medo da sorte que Deus nos dá de sobra.
Faz parte da paisagem interior da vida real.
É a estação onde há chegadas e partidas,
é o reality show do enredo da vida.
- Quem morreu, Maninha me diga?
Foi o Xibimba,
irmão de Vira de Lucila de Preta.
De quê? Vai saber…
Acha-se que foi
de morte natural,
e viver a vida.
Adeus,
luto
e ponto.
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