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domingo, 4 de julho de 2010

SÃO PEDRO, DE COSTAS PARA A RUA DO ARAME?


autor: João Ludugero

nas rua São Pedro atravesso becos
que vão dar na rua do arame,
ali onde ficava a casinha de taipa
da minha avó Dalila
ali onde morava dona Neda
ali onde ficava a bodega de Zé Anjo
onde a gente comprava puxa-puxa
e quebra-queixo de coco queimado

São Pedro continua lá no topo da igreja,
dizem as más línguas, de costas
para a rua do arame, não importa,
eu continuo enluarado de lembranças,
do tempo em que a gente pensava como criança
ou acreditava que a vida era rica de marré-de-si
e que o anel que ela nos desse era de ouro
que aquela rua simples era toda ladrilhada de brilhantes
que o nosso diamante era pra sempre, nossa eterna alegria
e a gente fazia do dia-a-dia uma ciranda dos contentes
ali mesmo na rua do arame, gente humilde
que tem a bênção do apóstolo padroeiro,
pois ele protege a todo varzeano, de frente e verso
seja bacurau ou corujão, ele une versos e avessos
na cor maciça do encanto
que faz a minha gente tão hospitaleira

E a gente brincava de viver na roda do tempo
mirava o sol pela carne das cantigas,
as meninas pulavam corda, pimentinhas,
e nós jogávamos bola no campo improvisado da rua de Lucila
a gente tinha o condão de acreditar que um dia a sorte chegaria
a gente era simplesmente feliz  ali na rua do arame

o tempo passou, a rua ficou, o sonho não acabou
apesar de que Magnólia de Antonio Horácio foi embora pro Rio
e nunca mais voltou;
dona Alice de Abílio foi morar no reino das maravilhas
e até dona Maria de Seu Odilon já foi morar do outro lado...
mas São Pedro ainda está lá
e com certeza, mesmo de costas, ele olha por nós todos,
até pelo avesso ele tem as chaves que abrem as portas
desse chão varzeamado, de fé e poesia!

às vezes entro na casa das lembranças
preso por um fio, presente-passado
durmo então melhor, acordo feliz da vida, resignado,
porque o que amo nem mesmo o silêncio vai me fazer calar,
porque eu tenho as minhas raízes fincadas ali
eu tenho uma história pra contar,
que não tem hora pra acabar,
pois sou poeta e ainda acredito na força do sonho
acordado, ainda sou aquele eterno menino varzeano cheio de memórias

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