A bem da verdade, tem razão o folclorista Deífilo Gurgel, que deu o título de Cidade da Cultura a Várzea, ao recordar que, na época em que foi diretor de promoções culturais da Fundação José Augusto, em 1979, quando pesquisou sobre o mamulengo no Rio Grande do Norte, descobriu que a nossa cidade estava inclusa entre as aquelas cidades onde haveria um dos últimos mamulegueiros no estado.
O mamulengo faz parte da cultura popular nordestina. A origem do nome é controversa, mas acredita-se que o termo deriva da expressão “mão molenga”, mão mole, numa referência à mão ideal para manipular os bonecos. Nele há um pano à frente, atrás do qual se escondem um ou mais manipuladores que dão voz e movimento aos bonecos.
Fui testemunha ocular dessa manifestação cultural, digo o teatro de bonecos em nossa Várzea. Lembro-me muito bem da alegria quando se reunia a criançada e os adultos para ver a montagem e encenação do João Redondo na casa de seu Pedro Calixto, situada na rua Deputado José Lúcio Ribeiro, vizinho de dona Zidora Paulino.
É com imenso orgulho que me recordo do varzeano Pedro Calixto, que manuseava o João Redondo, o qual era apresentado por detrás de uma cortina colorida na sala de estar de sua morada, e as histórias eram baseadas no quotidiano envolvente, caricaturando tipos e situações do dia-a-dia. Essa forma teatral popular tanto agradava a adultos como crianças. Como espectáculo, possibilitava um contacto imediato e espontâneo com o público presente, sendo capaz de comunicar de forma ideal junto das diferentes faixas etárias da comunidade de Várzea.
Por oportuno, cabe cingir que o teatro popular de bonecos recebe várias designações em todo o Nordeste. Em Pernambuco, por exemplo, chama-se Mamulengo, enquanto no Rio Grande do Norte e Paraíba é denominado "João Redondo". Essa expressão da cultura popular, originária da Ásia, trazida pelos ibéricos, encontrou no Nordeste um verdadeiro celeiro de calungueiros, como se chama o homem que manipula os bonecos em nosso estado.
Um teatro simples, irreverente, apresentado por bonecos rústicos, feitos de pano, muito expressivos, acoplados nas mãos de apresentador, dando-lhes vida em pequenos atos hilariantes, permitindo que sua duração varie, ao sabor das circunstâncias.
Por derradeiro, vale ressaltar que em Natal, a arte do João Redondo permanece viva graças aos calungueiros, como Chico Daniel, segundo Ariano Suassuna, o maior “bonequeiro” do Brasil. Após o falecimenteo de Chico Daniel, seu filho continua mantendo acesa a chama do teatro de bonecos popular. Também pode se encontrar no Conjunto Nova Natal o Zé Relampo, carroceiro de profissão que apresenta o “João Redondo” de forma tradicional, destacando sua voz.
Viu, só gente! É Várzea presente no cenário artístico cultural, no imaginário popular do nosso povo, são as nossas raízes que, apesar de adormecidas, como é o caso do João Redondo, ainda pulsam e poderão, por que não, renascer das cinzas. Importante é, pois, compreender que tudo isso pode ser resgatado, uma vez que empenho, determinação e espírito entusiasta não faltam ao repertório cultural da nossa gente, que tem o prazer de fazer bem feito. E que sobrevivam as raízes da Cidade da Cultura potiguar, nossa amada Várzea!
Nenhum comentário:
Postar um comentário