A PROFECIA
Eles foram feitos um para o outro.
O encaixe perfeito. Ele se chamava Íris.
Ela também tinha o mesmo nome.
Coisa rara, coincidência: Almas gêmeas,
Formavam a laranja inteira. Coisa do destino.
Ela de escorpião, ele virgem. Muito significativo.
A cartomante profetizou que foram feitos um pro outro,
Estava escrito nas estrelas, na linha da mão,
No sorte das cartas do tarô, nos búzios da vidente,
Não descuidavam do que lhes alertavam os signos,
Liam o horóscopo, dia-após-dia, religiosamente.
Fazia sentido, o nó fora dado,
Muito bem atado ele não tinha dúvidas.
O ciúme doentio os afastou até dos amigos.
Eles se bastavam na solidão de ser apenas dois.
Dominado, ele a amava de paixão, cegamente;
Ela achou que achara o seu homem,
Anteviu a letra "I" na linha da vida,
Na borra de café, no caule da bananeira.
Fez tantas simpatias, coseu foto em patuá,
Perdeu a conta de quantas velas acendeu
Para Santo Antônio de cabeça para baixo
E para todos os santos.
Estava tudo certo para o enlace na matriz
De Nossa Sra. da Penha, onde eles pagaram promessa
De se entregarem só depois do casório.
E foi dura a penitência,
Quase autoflagelação, quando ambos
Ajoelhados subiram os 365 degraus da escadaria da igreja
- um para cada dia do ano-
Esqueceram e marcaram o dia "D" do evento
Para o dia 29 de fevereiro
- Não teve degraus para eles no ano bissexto -
Mesmo assim, demarcaram a sorte e agradeceram
Por se acharem tão cúmplices com as bandas de suas caras-Metades. Reservaram a igreja, as flores, o luxo da festa. Delimitaram o número de convivas, padrinhos, pagem.
E logo Marcaram a data para a troca das alianças.
Aos olhos do mundo, tudo estampava
Indizível felicidade! O amor é lindo!
Logo veio a pomposa cerimônia, e virgem santa! Pasmem.
Aconteceu o que ninguém esperava:
O padre se disse impedido
Para o intento, não haveria mais casamento, de fato,
Uma vez que aquela mulher fez ele ser o que é hoje: Padre.
Ele entrou para o celibato, fez voto
De castidade com Deus, tudo Isso em causa.
Mas nunca deixou de amar aquela Íris
Arqueada à sua Frente, até depois da batina imposta.
Íris era sagrado segredo de Estado.
Mas o Sacerdote roubou a cena,
Perdeu a cabeça, esqueceu-se de sentir dó,
Deixou de lado o pecado, afastou o próximo,
Tendo em vista que ele a viu primeiro
E seria o último a desposar aquela mulher,
Abraçou a noiva com toda força
E a beijou no altar-mor
Diante do Cristo crucificado.
Santo Deus!
Ela, contente, abriu um sorriso iridescente,
Meio conivente, quase feliz sem acreditar
Que aquilo tudo estava acontecendo.
Aos olhos alheios, não se importaria mais
Se agora fosse virar mula-sem-cabeça.
Sob o olhar perplexo daquela multidão alardeada,
Mais de 200 testemunhas na mira do ato.
Foi aí que o ex-noivo sacou de pistola calibre 38
(Perdão! Teria sido um revólver Taurus 38?),
Atirou para o alto quase aos pés de um santo,
E furioso, atordoado, aos berros,
Ameaçou dizimar a todos, e a ele próprio,
Assustando aos presentes, que estupefatos com o quadro,
Chamaram a polícia, que lhe ofertou um par de algemas,
A fim de lhe arrefecer os ânimos.
Dilema resolvido, logo saiu dali feito um louco
Numa camisa-de-força: O ex-noivo
Algemado, com um par de alianças
De ouro 18k no bolso do casaco
E ainda estava lá o cravo branco na lapela do terno.
Saiu dali direto para a cela,
Por desacato à autoridade policial.
A vida tem lá suas surpresas desde o arco da velha,
Da retina à íris, a vida bebe dessas cores em dias embaçados,
De uma ponta a outra do arco-íris,
Seja nos dias de sol com chuva ou vice-versa,
De repente, seja nos dias em que a vida vem
E nos surpreende de certa maneira
Com cada cor, que ficamos boquiabertos,
Amar-elos
Com o queixo na mão,
Ou a mera queixa da vida real.