VÁRZEA: DE PEDRAS, SEIXOS E DE SONHOS ACORDADOS
Autor: João Maria Ludugero
Rua da pedra,
Teu nome mais popular, da boca do povo
porque ali havia uma formação rochosa
Um lajedo, quase uma enorme pedra
Que dava para o beco que dava saída
lá no oitão de seu Antonio Duaca
Sobressaindo já na rua grande,
Dando vazão ao passeio público.
Rua da pedra,
rua da matança dos porcos
lá o quintal da casa de seu Antonio Ventinha
Quem não se lembra do picadinho e do torresmo
Do mais gostoso sarapatel que a dona rosa preparava
Com os miúdos dos suínos abatidos?
Rua da pedra, teu vento vem das quatro bocas
E esconde a face da lendária mulher que chora,
quando as portas e janelas de Várzea se fecham
Quando a lua vara a noite a dentro, madrugada a fora,
Enquanto descansa essa brava gente
Que não mede esforços e vai à luta,a pegar no batente
A tecer seus sonhos acordados, logo-logo ali na rua da pedra.
Rua da pedra, que mantém acesa a chama
de que melhores tempos virão, de fato,
Porque enquanto meu povo descansa,
carrega pedras, com suor e determinação,
Porque ainda acredita na bandeira da fé e da perseverança,
Porque ninguém mais vai lhes roubar o sonho de sonhar.
Rua da pedra, dos paralelepípedos, da garra
Dos Seixos burilados pelo decorrer das horas
dos exilados amores que se foram pra longe,
mesmo não querendo ir embora, debulhados em lágrimas.
objeto em pedra seria o meu coração de te ausente,
Minha Várzea das Acácias, meu amado torrão...
Mas minha alma nunca arredou o pé das tuas crenças,
Meu corpo ainda se ajoelha e reza
nos degraus do pequeno cruzeiro
Só pra te agradecer, minha rua da pedra,
pela orientação precisa, pelo norte, pelo caminho
das pedras que aprendi logo ali no teu cerne.
Rua da pedra, pedra-pão de duro comer,
Pau-pedra corajoso de viver, de arregaçar as mangas
E botar a tristeza pra correr, pedra-pé que dá pé,
Pé-rachado na labuta no roçado, plantas voltadas
faces à terra agreste, seca língua da aridez, bravura
ranhuras de rocha viva, rua da pedra, rua do sonho possível
famílias de pedra, de lutas e de dona Conceição Dama, mãe do Pedro
Nobres famílias, nomes de paz que não morrem nunca, severinos,
Porque a vida está ali, humildemente modesta
Em sua maior riqueza: a beleza de ser varzeano,
A beleza de ser simples e ainda acreditar,
apesar dos pesares, na esperança remota,
Sem abandonar o sentido da pedra, o real significado
da palavra esfacelada em versos, lascas de pedra e sal
que se perdem em graus, mas que sobrevivem na voz
ainda seca na boca do destemido povo varzeano,
Que ainda acredita na força que brota
da terra prometida, além das coivaras ao sol
que queimam lenta e dolorosamente o coração da gente,
De saudades!
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