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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

QUANDO O CORAÇÃO DESPENCA

QUANDO O CORAÇÃO DESPENCA


Autor: João Maria Ludugero.


Eu estive a visitar o rio Joca
Vi o rio seco ali quase abandonado
Um resto de água parada, o que restou do rio
Eu voltei ao passado com meus pensamentos,
Remeti-me a outros verões, divaguei
Feito uma andorinha só no desvão do tempo
Tempo de outrora, tempo de cacimbas
De água potável e banhos de cuia.


Eu vi a tarde derramar sombras
Nas ribanceiras do rio, eu vi os juazeiros
Vi e ouvi os anus-brancos e pretos
A gravetar seus ninhos nas verdes copas
Dos arbustos agrestes espalhados ao largo
Do caminho que leva ao Vapor de Zuquinha.


Vi a imensa areia branca do rio,
Uma praia fluvial onde me deitei
e junto comigo desabaram as lembranças
Do tempo em que éramos crianças e íamos pescar
Ali nas pedras e locas do rio de Nozinho.


Pisei na areia morna, espiando ao redor
Estive inteiro, situado ali no leito seco do rio
E senti o coração apertar, senti a vida pela metade
Bateu uma saudade do tempo em que a gente ficava ali
Zambeteando na beira do rio sem pensar na ilusão do mundo
Sem pressa para o dia encontrar a noite e a gente ver as estrelas.


Eu pisei na areia do rio
E mais ninguém pisou como eu pisei.
Eu senti a brisa gangorrando as frondes
Do coqueiral, o vento alisando as folhas,
os galhos dos marmeleiros, ruídos de preás.
Eu pude sentir o aroma das flores do mato
Meu coração parecendo cair e se espatifar
Meu corpo beirando o rio, minha alma lá no fundo
do poço do rio da Cruz, onde mergulhei fundo
sob o crepúsculo a bafejar suas sombras mais cedo.


De repente, senti no peito uma ausência: a de Dona Neda.
Ela não mais estava ali com seu landuá.
E chegou a noite. E com ela dormiram as lembranças.
E com a noite chegaram os vagalumes e os grilos a trilar
E meu coração parecia cair e se espatifar nas pedras,
os seixos a rolar pela vida se espatifando na desilusão do mundo.


Acordei quando a noite chegou.
E voltando para casa, ainda sonhava
e coloria aquelas coisas sentimentais.
Ia pensando em lavrar meus poemas,
plantar e colher meus versos simples
Não em terreno alheio, mas como bom varzeano
a melhorar de vida, no murro pesado de sonhar acordado
e acreditar na fartura da minha lavoura de poesias.


Amanhã quero acordar cedo e ver o sol varzeano
A despejar seus raios no amanhecer.
Quero ver cores vibrantes e ainda acreditar
que a burrinha da felicidade vai chegar lá só pra ver
A cara da minha gente despencando de contente, de verdade.


Amanhã quero renovar minhas esperanças,
viver o presente sem me lembrar de esquecer
de cultivar minhas raízes.
Quero poder me vestir de sonhos possíveis
e ainda acreditar na força
e na vida do rio Joca.


Quero ver pássaros a voar, voar
Quero ver o rio deixar-me encher
o samburá tomado de carás e outros peixes.
Essas maravilhas que só o Joca tem para oferecer
a este humilde e rico poeta andarilho.

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