Apesar da modernidade e da tentativa de globalização,
Na minha Várzea ainda tem dessas coisas.
Sim, ainda sobrevivem ritos e costumes, ao vivo e em cores,
Mormente nos dias que antecedem as festas dos santos.
São novenas para Nossa Senhora Desatadora de nós;
São simpatias e promessas para Santo Antônio;
São fogueiras e animadas quadrilhas para São João,
Folguedos e procissão para São Pedro apóstolo,
Este que é santo padroeiro mais festejado do lugar,
Sem contar as quermesses para outros tantos santos.
Cansei de encontrar pelas ruas e becos da Várzea e adjacências A incansável Dona Rola, ou Maria Batista da Conceição,
Ela que era fervorosa devota de Santa Luzia,
Carregava a imagem e/ou quadro de moldura estampando
O retrato da santa que trazia os olhos num prato
E na outra mão a esperança erguida numa palma verde.
Dona Rola rolava pelas quatro bocas, batendo de casa em casa,
A suplicar esmola para a festa da santa homenageada da vez.
Lembro-me de Dona Rola
Ou simplesmente Rola, como insistia em ser chamada.
Era assim que povo a conhecia,
Era assim que o povo a admirava: ROLA.
Mas não é a rola que estais pensando.
Não é aquela pomba, a fogo-apagô.
Apesar de pequena, achava-se bonita e ousada. Era isso ....
O que mantinha dona Rola de pé era a vida que ela levava.
Arrebitava o nariz e partia para a labuta, sem lamentação,
Com garra, determinação e o sagrado prazer
De fazer bem feito seu ofício.
Ela era assim. Filha contente da terra agreste.
Dona Rola saia do Itapacurá para pedir esmolas,
A léguas e léguas incansáveis, destemida, ela mais parecia
Que botava sebo nas canelas, e pernas para que as queria.
Para receber os donativos para a festa de Santa Luzia.
Era assim que se sentia feliz angariando oferendas,
Frutas, grãos e até animais
Que seriam vendidos para embelezar a festança.
Dona Rola sentia-se a mais rica das criaturas,
Nunca chorou ou passou fome pelo caminho.
Não sabia o que era tristeza, esquecia-se das dores
E nessa lida aprendera que, apesar dos pesares,
A vida é bela, ainda mais quando botava flor no cabelo
E usava aquele vestido novo de chita pra ver Deus,
Para louvar a Deus mais de perto. E se sentia grata,
Porque dava pra ver a felicidade nos seus olhos de festa,
Ela no meio das crianças a soltar rojões e fogos de artifício
Que se alastravam pelo chão da Várzea
Fazendo a noite virar dia
A alumiar os céus
Numa chuva de prata.