O MENINO DO REALEJO,
por João Maria Ludugero
Eu sou Ludugero
Desde que me entendo
por Ludugero...
Sou escritor
Sou poeta
Sou pedra
Sou água
Eu estou na lida
Eu vou por aí
Astuto serelepe
Sem medo da cuca
Menino levado da breca
Moleque maduro
Desde aqui
A correr dentro e alto
Pelo interior: Esvoaço!
Não. Não versejo o que sou.
Escrevo o que não sou.
Sou erva, mas não daninha,
Não me dano, eu me arrimo!
Eu acendo, eu me inflamo!
Estou sem penas. Fiz asas.
Escrevo pássaro. Sou canção.
Sou o prumo do desembaraço.
Desentristeço. Escrevo contente.
A poesia é sempre o reverso da estripulia.
Não se trata de mentira em alvoroço o que faço..
Não sou mera coincidência. Sou gaiato e arteiro.
É que sou corpo desatado ao léu:
Sou asa esbugalhada de mim, medonho!
O vão é o lugar onde moram as coisas cortadas
que ainda nos foram retomadas ao fojo da ventania...
Sou presença de ausências, dia-após-dia, desvairando a mente.
Daí a saudade, que é quando a carta do realejo não está onde está.
O poeta escreve outro bilhete para invocar esse fardo ausente.
Toda poesia é um feitiço fora da vila, uma cantiga em desvario.
Ato de feitiçaria cujo objetivo é tornar presente e real
Aquilo que está diamante no leito do vertente riacho minado,
Sou rio a fluir na embocadura do vasto oceano,
Mas não tenho sede, ao percorrer o desafio do labirinto,
Senão através do oásis-meio da toada que me nina...